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11.5.14

Odes

Odes
Miguel Torga
???
Poesia

Livrinho muito velhinho recolhido da convenção do BookCrossing do ano passado. Qual a minha surpresa quando o abro e vejo que é uma edição especial de 60 exemplares numerados, todos eles assinados pelo autor! Mas quel preciosidade, meldels!!

é um conjunto de odes, várias homenagens a diversas coisas. São essas coisas da natureza e deuses gregos, que - por si - também representam coisas da natureza. A cada página virada, um sorriso se abria. Cada nova ode era uma surpresa, e há odes para tudo, desde o sol à música.

São pequenas constatações do que é observado, mas com uma beleza extraordinária. Um olho clínico que encontra nas coisas mais simples características que são puras e verdadeiras, se bem que por vezes apresentam expectativas inesperadas.

Sem dúvida vale a pena ler.

O que gostei menos foi o da lua, mas deixo aqui o que gostei mais.

À Terra

Também eu quero abrir-te e semear
Um grão de poesia no teu seio!
Anda tudo a lavrar,
Tudo a enterrar centeio,
E são horas de eu pôr a germinar
A semente dos versos que granjeio.

Na seara madura de amanhã,
Sem fronteiras nem dono,
Há-de existir a praga da milhã,
A volúpia do sono
Da papoila vermelha e temporã,
E o alegre abandono
De uma cigarra vã.

Mas das asas que agite,
O poema que cante,
Será graça e limite
Do pendão que levante
A fé que de tua força ressuscite!

Casou-nos Deus, o mito!
E cada imagem que me vem,
É um gomo teu, ou um grito
Que eu apenas repito
Na melodia que o poema tem.

Terra, minha aliada
Na criação!
Seja funda a vessada,
Seja à tona do chão,
Nada fecundas, nada
Que eu não fermente também de inspiração!

E por isso te rasgo de magia
E te lanço nos braços a colheita
Que hás-de parir depois...
Poesia desfeita,
Fruto futuro de nós dois.

Terra, minha mulher!
Um amor é o aceno,
Outro a quentura que se quer
Dentro de um corpo nu, moreno!

A charrua das leivas não concebe
Uma bolota que não dê carvalhos;
A minha, planta orvalhos...
Água que a manhã bebe
No pudor dos atalhos.

Terra, minha canção!
Ode de polo a polo erguida
Pela beleza que não sabe a pão
Mas ao gosto da vida!

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